domingo, 27 de janeiro de 2019

Cocriando a realidade (ou lições do Prem Bento)



Davi e Bento estão numa fase competitiva. Tudo se torna uma disputa pra ver quem faz/chega primeiro. Eu, confesso, algumas vezes uso isso para conseguir o que quero mais facilmente, tipo:

- Quem guardará mais brinquedos hoje?
- Hora do banho, quem chegará primeiro ao banheiro?
- Quem será o primeiro a colocar o pijama?

Ao que eles repondem rapidamente e juntos:

- EU! - e começam a fazer o que devem. Normalmente uso esse incentivo depois de já ter pedido uma vez sem sucesso.

Nas outras vezes, porém, essa competição só resulta em brigas e choradeiras, porque, óbvio, o perdedor sempre se ressente em alto e bom som. 

Bento, porém, acabou de me dar uma lição de vida, que quero compartilhar. 

Fui colocar o saco de lixo na lixeira que fica em uma porta do outro lado do longo corredor do andar onde moro. Da nossa porta até a lixeira dá uns - o quê? - 100 metros rasos. Saindo na porta, Davi já adiantou:

- Bento, eu vou ganhar, tá?! Você vai perder.

- Por quê? 

- Porque você precisa perder. - Davi esclarece.

- Não, eu não preciso. Eu vou ganhar.

Abro a porta e começam a correr, Davi na frente gritando:

- Eu to ganhando.

Bento, atrás, comemora:

- Eu to ganhando! Eu to ganhando! 

Davi, puto, ainda tenta acabar com a festa dele:

- Não, você ta perdendo. Você perdeu! Você perdeu!

Mas de nada adianta. Bento está em êxtase comemorando sua vitória. Felicidade inabalável.



sexta-feira, 20 de abril de 2018

A novela da minha vida

Davi começa a cantar baixinho, voz suave:

- Bento cocô, Bento cocô...

Bento chora copiosamente falando:

- My não cocô. Não! My não cocô.

Eu interfiro:

- Não, filho, vc não é cocô. Davi, PARA, filho.

Davi para.

Bento ainda com olhos cheios de lágrimas, entoa baixinho com voz suave:

- Davi cocô, Davi cocô...

Davi chora copiosamente:

- Eu não sou cocô. Não! Eu não sou cocô.

Interfiro.

E assim sucessivamente.

terça-feira, 13 de junho de 2017

Davi e sua sabedoria ancestral

Davi:

- Mummy,  I want a train cake. Blue. Com gudão.

- Com o quê?! - perguntei esperando ouvir "algodão".

- Guidão, mãe, pra dirigir.

- Nossa, filho! Mas aí fica muito difícil de fazer.

- I can help you, mummy.

E continuou, gesticulando com as mãozinhas:

- We take o difícil, cut it into little pieces e fica fácil.


terça-feira, 6 de junho de 2017

Dicas que efetivamente me ajudaram no parto natural

Quero compartilhar umas coisas que aprendi no livro Mindful Birthing e que me ajudaram MUITO a passar pela experiência de um parto normal sem anestesia e com máxima consciência. Para quem estiver prestes a passar por isso, seguem as técnicas para que o parto seja sem sofrimento, embora dolorido - o que é inevitável, dado à brutalidade natural de um parto.

- A dor da contração é uma dor transformacional, as fibras musculares do útero estão mudando a forma para possibilitar a abertura de seu colo e a expulsão do bebê. É uma contração/expansão. Encare dessa maneira, tente visualizar a abertura, a expansão. Cada contração é um passo mais perto que vocês estarão de conhecer a carinha do bebê de vcs.

- Não resista à dor. Dê boas vindas a ela. Tente localizar onde exatamente ela acontece (baixo da barriga, meio, lombar, etc). Na hora da contração, esteja mentalmente presente, sinta com curiosidade essa transformação que está acontecendo dentro de você e que está trazendo seu filho até vocês. Visualize. Investigue com atenção.

- A contração do trabalho de parto é semelhante a uma coceira, no sentido em que começa com baixa intensidade, atinge um pico, e depois reduz a intensidade até seu completo desaparecimento, como uma onda. (curiosidade: se resistirmos a coçar no pico da coceira, veremos que uma coceira também desaparece) Esse ciclo todo da contração dura de 45 a, no máximo, 90 SEGUNDOS, sendo que o pico dura uns 5 segundos. E é por esse tempo que vc terá que sentir a dor. Depois ela desaparece COMPLETAMENTE até a proxima.

- Aproveite o intervalo entre as contrações. As contrações ocorrem com um intervalo entre 4 a 3 minutos (na fase ativa do parto). Esse tempo não é simplesmente um tempo "sem dor". É um tempo de profundo relaxamento e alívio. Profundo prazer. A mais poderosa de todas as drogas! Esteja mentalmente presente para curtir isso. Tente perceber essa sensação que é única e maravilhosa. Para isso, respire. (eu lembro de eu focada na respiração entre as contrações e repetindo o mantra "aproveita o intervalo. aproveita o intervalo.", com isso eu passei a madrugada toda)

- Respire. Respire. Respire. E foque na respiração. (Isso é o que vc, Pai/Acompanhante, terá que lembrá-la, porque na hora que dá o desespero da dor a tendência é resistir e fugir de alguma maneira. Mulher, foque na sua respiração e estará completamente presente e consciente.

- Na hora que pensar "Não aguento mais!", é hora de um banho quente. Chuveiro! Água morna tem um poder absurdo de aliviar a dor! (passei dos 4 aos 7 cm debaixo do chuveiro)

- Faça o que seu corpo quiser. Escute o seu corpo. (eu, por exemplo, não fiquei deitada nem 1 minuto sequer. Nem pra parir, meu parto foi na vertical mesmo) Se quiser gritar, grite. Esteja com sua atenção totalmente voltada para você, para sua respiração, para o seu útero, que saberá o que precisa fazer. NÃO SE REPRIMA.

- Uma contração por vez. Não pense em quanto tempo durará cada fase do parto. Apenas receba uma contração por vez. Respire junto a ela e passe por ela. Uma, apenas uma. Por vez. 45 segundos. Você consegue!!!! RESPIRA.

- A mudança entre as fases do parto (ativo pra fase de expulsão) é nítida! Isso eu achei animal nos dois partos. Tem uma hora que você vai precisar empurrar, vai QUERER empurrar, vai sentir uma necessidade incontrolável de empurrar junto com as contrações. Antes dessa fase, você só sentirá que precisa "sobreviver", respirar, esperar e curtir o intervalo! (sério, não deixe de curtir esse estado indescritível de êxtase que é o intervalo entre contrações)

- Na fase de expulsão (que pode ser sentida como se quisesse muito fazer cocô), as contrações são mais frequentes, intervalos mais curtos - o que é bom, acredite! - e você vai fazer força de fazer cocô. Você quem vai querer fazer isso. Será inevitável. Apenas não se reprima!

- Na saída do bb, vc vai sentir uma pressão muito forte abrindo seu corpo. Nessa hora, RESPIRE. E pense que seu bebê ja está MUITO perto (tão perto que, nessa fase, você pode literalmente tocá-lo). Em muito pouco tempo você terá ele no seu colo. ❤ ❤  Eu achei essa a dor mais forte, beirando o insuportável, mas é o grand finale! E passa rápido. Parte do corpo do seu filho já estará pra fora e a vontade de vê-lo por inteiro te dará força para resistir bravamente.

Aí, meus amados, é só amor!!! É muito amor! É uma explosão de amor.

- Tem o parto da placenta também, mas é outro nível de dor. Pra quem acaba de parir um ser humano completinho, a placenta é mole. Literalmente.

- Durante o trabalho de parto, talvez a mulher precise de contato físico com o pai. Pegar forte na mão, carinho, massagem. Talvez prefira a distância. Não dá para prever. Pai/acompanhante, esteja lá atento para atender ao que ela precisar. Mulher, você manda!

- Bater papo pra distrair não é bom. O bom é focar no presente, na respiração, no interior. Vivenciem o presente.

Desejo toda a sorte do mundo para os que estão prestes a passar por isso! Que o parto seja o mais tranquilo possível! Dizem que tem mulher que dá à luz sorrindo e é isso que desejo a todas as mulheres! Ah! O livro falava isso mesmo, pra tentar sorrir durante as contrações. Parece que ajuda, mas eu nao consegui. Eu focava na respiração e só.

Boa sorte e me coloco sempre disponível a dividir minhas experiências sobre qualquer assunto relativo à maternidade, puerpério, amamentação, pós-parto, etc. Estamos juntas, mulherada!

quarta-feira, 17 de maio de 2017

May 16, 2017.

Imagino que todo mundo que me conhece sabe o quanto valorizo meu aniversário. É um dia em que me sinto diferente desde a hora em que acordo - cedo, nesse dia, pro dia ser bem longo - até a hora em que vou dormir - depois da meia noite, nesse dia, para aproveitar até o último segundo. E não trabalho no meu dia também não. É feriado religioso, na minha religião.

Acredito que uma forma importante de autoconhecimento é olhar para nossos relacionamentos e para como os outros nos enxergam. Nós temos uma idéia de quem (achamos que) somos, mas ela só é verdadeira se os outros nos percebem da mesma forma. Assim como a comunicação é definida pelo ouvinte, nós somos, em última análise, quem os outros percebem.

Eu lembro que (aviso gatilho: bullying) meus irmãos me chamavam de "soja" quando criança, que não tem gosto de nada, fica com o gosto do que vc cozinha junto com ela. E penso que eu também acreditava nisso, pois nunca tive - na minha percepção - nenhuma característica própria muito forte, que ressaltava em mim e me diferenciava dos outros. Eu era o que todos em minha volta eram: normal. Na verdade, ainda penso assim.

Nessa jornada pessoal de autoconhecimento, a minha maior busca é, confesso: saber quem sou. Eu, honestamente, não sei. Sei o que sinto em alguns momentos, mas sei também que estou em transformação constante. Situações e pessoas que me abalavam em algum momento do passado, hoje não me tocam de forma alguma ou, até, provocam reação oposta à que costumavam provocar.

Minha autoimagem é de uma pessoa fácil, leve. O que parece não ser a percepção dos que convivem diariamente comigo.

Uma coisa que tenho tentado fazer é olhar para todos os meus desconfortos como oportunidades de ouro para me conhecer, finalmente. Quero desesperadamente saber quem sou, me definir de alguma forma, me entender.

Sei bem quem eu quero ser. E sei que não cheguei lá. Mas não sei quem sou hoje.

Ontem passei o dia com pessoas queridas, lendo mensagem de todos e buscando nelas um pouco sobre mim, embora ciente de que no aniversário todos falam só das coisas boas. É uma amostra bem parcial de nós e, portanto, não confiável. Mas tive também, como tenho diariamente, a oportunidade de entrar em contato com a parte minha que não é socialmente aceitável. A parte que grita, que não escuta o outro, que não tem paciência, que é egoísta ao extremo. Essa, quando aparece, me domina e me cega. Só consigo refletir sobre ela depois.

Penso que já melhorei muito. Não me altero emocionalmente mais por futebol e me sinto aliviada por isso. Mas talvez só porque não estou mais assistindo ou seguindo nenhum campeonato. Cortei o estímulo. Deu certo, vivo emocionalmente muito melhor sem ele.

Divergências políticas, entretanto, ainda despertam o "pior" em mim, o mais selvagem e passional. Tocam num ponto de extrema sensibilidade. O caminho do desapego nesse campo ainda é longo e estou só no começo, consciente da necessidade de mudar isso.

Mas esse nem era o rumo que eu queria dar pra esse texto. Comecei a escrever porque não conseguia trabalhar sem compartilhar minha profunda gratidão por todas as pessoas que fazem parte da minha vida. Sou um pedaço de cada um em cada hora. Reparei que todas as mensagens que falavam de alguma característica específica "minha", vinha da pessoa que a tinha, especificamente.

Portanto, meus amigos, eu sou mesmo um espelho do que vcs vêem em mim. Eu sou soja mesmo, sou todos vocês e sou feliz por isso. Feliz pelo privilégio de ter nascido na família em que nasci, ter feito as escolas/escolhas que fiz, ter conhecido as pessoas que conheço. Todos, juntos, me trouxeram até aqui e ao que sou, hoje.

Minha gratidão imensa e todo meu amor! Vocês me emocionaram muito ontem e me senti pertencente a uma coisa muito maior que eu. Obrigada por isso. Sei que não estou sozinha e nada do que fiz de bom até hoje é mérito exclusivo meu. Esse doutorado, inclusive, que - oxalá - está com os dias contados, não é um trabalho meu. É de todos nós. Dos amigos pacientes com a minha ausência, da minha família no Brasil que se reorganiza de todas as formas e quantas vezes forem necessárias para que eu continue caminhando, dos meus filhos que empurram meus limites diariamente, dos amigos do Canadá que me acolhem como família - e me sinto assim, em família! - enfim, GRATIDÃO é o que emana de mim hoje e que estava me impedindo de trabalhar sem ser compartilhada.

Muito obrigada!

Agora deixa eu continuar tocando o barco, porque a mão que vai digitar a tese é essa aqui e cada minuto conta. Vamos que vamos!

segunda-feira, 1 de maio de 2017

Natureza (quase) perfeita

Bento (1 ano e 3 meses) está mamando muito menos e, consequentemente, meu corpo diminuiu consideravelmente a produção de leite (a natureza é perfeita). Passei, finalmente, a não precisar do sutiã de amamentação e voltei a dormir livre dele.

Hoje de manhã, tomando o café só de camisola de alcinha, Davi (3 anos e 3 meses) pergunta:

- Mãe, por que seu peito tá assim?

- Assim como, meu filho?

- Caído.

...

PS: Nesse caso, a palmada educativa está liberada, ne?!

Desabafo (Greve 28/03/17)

O que estamos fazendo uns com os outros?! Quando que uma vidraça passou a ser mais importante que uma vida? Quando o fato da CUT e sindicatos defenderem direitos dos trabalhadores passou a ser visto como uma coisa absurda? Quando fazer política "sem partido político" passou a ser visto como uma coisa boa? 

Precisamos parar tudo e repensar nossas relações. Olhar para o outro como nosso semelhante, que é. Praticar a compaixão e empatia, independente das diferenças sejam elas quais forem (gênero, raça, fé, sexualidade, posição política, etc). Somos todos vítimas de nós mesmos. E somos todos salvadores de nós mesmos também. A solução, na minha visão, está em nos olharmos nos olhos e nos reconhecermos iguais, que somos.

Estou arrasada com o crime contra o estudante Matheus Ferreira, em Goiânia (minha cidade). Sinto dor física no peito ao ver a imagem (não tive coragem de assistir ao vídeo). Sinto também pelo PM que cometeu esse ato horrível e é vítima também. Foi treinado a desumanizar o seu semelhante e, com isso, perdeu sua própria humanidade. 

Vamos, por favor, parar com essa dualidade de esquerda e direita e olhar para o espectro. Todos, no fundo, queremos as mesmas coisas. Precisamos saber ouvir e respeitar o diferente. Achar um caminho novo. 

Tudo começa com uma prática fundamental e simples, embora dolorosa: olhar para o outro como seu semelhante. Sentir a dor do outro como a sua. Por favor, vamos praticar isso em todas as relações, reais e virtuais. Estamos todos no mesmíssimo barco! Ou nos salvamos todos ou morreremos todos.